Depois de Auschwitz
Eva Schloss
Universo dos Livros
2013
303 pag
Sinopse: Em seu aniversário de quinze anos, Eva é enviada para Auschwitz. Sua sobrevivência depende da sorte, da sua própria determinação e do amor de sua mãe, Fritzi. Quando a guerra termina e Auschwitz é finalmente extinto, mãe e filha iniciam uma lona jornada de volta para casa. Elas procuram desesperadamente pelo pai e pelo irmão de Eva, de quem haviam se separado.
Esse é um depoimento honesto e doloroso de uma sobrevivente do Holocausto. As lembranças e descrições de Eva são sensíveis e vividas, e seu relato traz o horror para tão perto quanto poderia estar. Mas também traz a luta de Eva para viver carregando o peso de seu terrível passado, ao mesmo tempo em que inspira e motiva pessoas com sua mensagem de perseverança, de respeito ao próximo e de humanidade.
Autora: Eva Schloss nasceu em Viena, Áustria, em 1929. A aterrorizante experiência no campo de concentração de Auschwitz-Birkenau foi narrada em seu primeiro livro, A história de Eva, lançado em 1988. A obra foi adaptada para o teatro e já emocionou espectadores da Europa, dos Estados Unidos, da Austrália e até da Ásia. Em 2012, Eva recebeu do príncipe Charles o título de Membro do Império Britânico pelo seu trabalho com a Fundação Anne Frank e com outras entidades beneficentes relacionadas ao Holocausto, dando continuidade ao trabalho de seu padrasto, Otto Frank, e garantindo que o legado de Anne nuca seja esquecido.
Links de compra:
http://www.saraiva.com.br/depois-de-auschwitz-o-emocionante-relato-de-uma-jovem-que-sobreviveu-ao-holocausto-4978476.html
http://www.livrariacultura.com.br/p/depois-de-auschwitz-42134532
Duas coisas me chamaram a atenção neste livro: o título - Depois de Auschwitz (não havia lido ainda nada diretamente de uma sobrevivente relatando o pós guerra) e a frase de marketing - O emocionante relato da irmã de Anne Frank que sobreviveu ao Holocausto (oi? até onde me lembrava a única irmã de Anne havia morrido no campo de concentração junto com ela).
Ao iniciar a leitura logo percebi que realmente o foco do livro era relatar sua vida antes, durante e depois da guerra, sendo uma leitura gostosa, tranquila e muito carregada de emoção, é impossível ler e não se sentir tocada pela autora, pelos seus mais profundos sentimentos ali relatados, e sim, principalmente no pós guerra.
E também logo é esclarecido sobre a questão de ser irmã de Anne Frank, que para a autora não é o importante, esse marketing acredito que foi desnecessário, a historia de Eva é tão rica e até mesmo diferente da de Anne, e elas não são irmãs, Eva foi enteada do pai de Anne, Otto Frank, e ela em nenhum momento diz que se considera sua irmã, mas por ter convivido com Otto é uma das responsáveis pela Fundação Anne Frank, e assume esse legado com muito orgulho, sendo um trabalho muito bonito e que foi a vida do pós guerra de sua mãe e Otto.
Ok pontos curiosos ressaltados, volto a parte que mais me chamou a atenção, que é o tipo de relato, a autora é autentica em suas colocações, expõe seu temperamento difícil e como a vida em família tem um valor muito grande para ela em todos os momentos do descritos no livro.
Não vou citar aqui a história de Eva, acredito que essa somente lendo e sentindo para se tornar conhecedor de seu conteúdo, mas separei passagens que julguei interessante, um diferencial desse livro e dessa autora. Como mencionei acima, não era necessário o vínculo com o livro de Anne Frank, pois seu relato é diferente, é proposital em deixar registrado sua sobrevivência, e como na maioria dos livros que li até o momento, era voltado a expor os horrores dos campos de concentração, os absurdos da SS, e nos fazer refletir em como o mundo deixou isso acontecer. Mas esse livro de Eva Schloss vai além, pois os sobreviventes do Holocausto, após a guerra, também sofreram, e muitos não sobreviveram. Voltar pra casa e para a vida livre foi novamente uma luta por sobrevivência, e é isso que essa autora relata com tanta vontade de mostrar ao mundo que não foi as "mil maravilhas", que os judeus continuaram a sofrer e muito, e por muito tempo, e assim muitos não resistiram.
"Naquele momento, decidi que eu não seria uma vítima, apesar de tudo o que havia acontecido comigo. Nunca permitiria a mim mesma ter uma mentalidade dessas - era quase como aceitar o papel de total desamparo que os nazistas queriam que sentíssemos. Eu não era impotente. Eu era uma sobrevivente."
E com essa colocação, Eva relata todas as dificuldades que enfrentaram, conta sobre sua família, amigos, conhecidos e como conseguiu seguir em frente, principalmente por ser tão ligada ao pai, e lembrar em vários momentos sobre seus ensinamentos, cito abaixo um dos ensinamentos que acredito ter sido crucial para a autora:
"... tudo o que vocês fazem neste mundo deixa uma marca. Nada se perde. Tudo o que vocês fazem de bom vai prevalecer na vida das pessoas com quem vocês tiveram contato. Essas ações e atitudes farão a diferença para alguém, em algum lugar, em algum momento, e as suas realizações serão levadas adiante. Tudo está conectado como uma corrente que não pode ser rompida."... " Neste livro, vou contar a vocês como tentei fazer o meu melhor para deixar uma marca no mundo."
Eva é a filha mais nova de um casal com dois filhos, ela e seu irmão mais velho Heinz, teve uma educação livre e apesar de julgar somente seu irmão como intelectual, Eva tem sim seu ponto de vista pautado na realidade, fazendo críticas fundadas e desenvolvidas pela história. Dessa forma, Eva faz em seu livro reflexões que antes não encontramos em outros livros de biografia, ela descreve em um dado momento sobre Hitler e em como Viena (onde a autora morava na infância) o excluía, e depois quando assume o poder na Alemanha e volta a Viena passa a ser querido:
"Hitler, filho de um funcionário da alfândega da cidade provinciana austríaca de Linz, odiava o internacionalismo de Viena - a modernidade da arte e da música, a sexualidade liberal e por vezes até uma política caótica, que o excluía de diferentes maneiras. Hitler era como um garoto pobre com o rosto grudado na vitrine de uma loja de doces enquanto a sociedade vienense, exclusiva de intelectuais, o ignorava."... "A cidade que o havia desprezado por tanto tempo agora o recebia de braços abertos, e a prioridade dele, segundo confidenciou ao chefe de propaganda nazista, Josef Goebbels, era limpar Viena da imundice e das baratas - ele referia-se aos judeus."
Com essa citação, já percebe-se que a autora faz alusões ao cenário político da época, critica as posições, alianças, e também em como o ser humano as vezes deixa de ser humano, passa a ser simplesmente corrupto. Nesse questionamento sobre o ser humano, faz uma citação do diário de Anne Frank:
"Anne Frank escreveu no final de seu diário, pouco antes de ser capturada, que ainda acreditava que as pessoas tinham bons corações, mas eu me pergunto o que ela pensaria se tivesse sobrevivido aos campos de concentração de Auschwitz e Bergen-Belsen. Minhas experiências revelaram que as pessoas têm uma capacidade única para crueldade, brutalidade e completa indiferença aos sentimentos humanos. É fácil afirmar que o bem e o mal existem dentro de cada um de nós, mas eu vi a realidade de perto, e isso me levou a uma vida de questionamentos sobre a alma humana."
Faz críticas as regras da sociedade, principalmente quando se muda (já casada) para a Suíça, afirmando que é um país autoritário e com muitas regras:
"Foram as regras que nos fizeram bordar estrelas amarelas em nossos casacos e nos enviaram em trens de gado em direção à morte. Onde estavam as regras sobre a compaixão, a humanidade e o ato de não matar seres humanos quando mais precisávamos dela?"
Em suas colocações também faz crítica aos que são colocados como "bonzinhos" e colocaram fim a guerra, crítica dura e de nada bonzinhos, e sim interesseiros:
"Desde o final da guerra, muitas histórias sobre o papel e sobre os atos das Forças Aliadas surgiram. Algumas delas defendiam a ideia de que um lado era "mal" e o outro "bom", e talvez com razão. Documentos mostraram que os britânicos e os norte-americanos tinham total consciência do extermínio de judeus em Auschwitz já em 1943 - e rejeitaram uma petição para bombardear as câmaras de gás no verão de 1944. um funcionário do ministério britânico de Relações Exteriores escreveu que o bombardeio a Auschwitz poderia levar a uma "inundação de refugiados" que, em busca de pátria independente, se deslocaria para a Palestina, até então um protetorado britânico. Talvez o bombardeio a Auschwitz tivesse feito pouca diferença, pois a maioria de suas vítimas já estava morta naquele momento. Talvez, quem sabe, mais pessoas pudessem ter sido mortas no ataque. O que se sabe com certeza é que ganhar a guerra e manter uma política forte de anti-imigração foram as prioridades dos Aliados - não a iniciativa de ajudar os judeus."
E para finalizar, uma reflexão sobre Holocausto, colocado por Eva de maneira sincera, intelectual e emocionante:
"... O Holocausto foi um horror único ou apenas um entre muitos outros horrores que aconteceram? Por meio de Otto, e depois por meio do trabalho da Anne Frank House e na Fundação Anne Frank, fiquei sabendo de muitos casos de genocídios, assassinato e discriminação, e cada um pareceu igualmente terrível para as pessoas que vivenciaram tais experiências. Apesar disso, creio que a determinação dos nazistas em exterminar todos os judeus da face da Terra - e o fato de muitos indivíduos comuns terem permitido que isso acontecesse - não tem qualquer paralelo histórico. Mas é claro que não o vivenciei como um fato histórico. Posso contar apenas sobre algo pessoal que aconteceu comigo e como sobrevivi a ele."
Espero que muitos leem esse livro, e sinta a emoção de conhecer mais esse momento da história mundial, que foi horrível, deixou marcar profundas, mas que algum sobreviveu para nos contar, e nos fortalecer de que podemos fazer a nossa parte para ser diferente, para ser amor, empatia e acima de tudo humano.