O diário de Helga
Helga Weiss
Intrínseca
2013
238 pag
"Agora é tarde demais. Ficarei e aguentarei até o fim. Se estou destinada a morrer, que assim seja. Que seja feita a vontade de Deus." (página 182)
"Que os alemães vejam que não estamos incomodados. Deliberadamente, mantemos rostos alegres e nos forçamos a rir. Deliberadamente, para irritá-los." (página 40)
Calcula-se que das 15.000 crianças que passaram pelo campo de internamento de Terezín, na antiga Tchecoslováquia, apenas 100 chegaram com vida ao fim da Segunda Guerra Mundial. A respeitada artista plástica Helga Weiss é autora de um dos mais comoventes testemunhos do Holocausto. Aos 83 anos, ela vive em Praga, no mesmo apartamento em que morou com os pais antes da deportação. Em 1938, por ocasião da ocupação nazista em seu país, a menina de 8 anos, filha de um bancário e uma costureira, começou a escrever e a desenhar suas impressões sobre tudo que aconteceu com sua família. Em um caderno, Helga narra a segregação dos judeus ainda em Praga, a desumana rotina de privações e doenças de Terezín e sua peregrinação ao lado da mãe por campos de extermínio como Auschwitz, onde escapou por pouco da câmara de gás.
O relato da artista plástica Helga Weiss é mais um testemunho entre tantos que nos contam sobre os horrores do Holocausto e da perseguição aos judeus e não-arianos na época da II Guerra Mundial. Escritos feitos por ela ainda criança, que viveu tudo isso e registrou em folhas de caderno.
Confesso que facilmente me desperta interesse o livro com essa temática. Não é novidade obras que relatam os campos de concentração, e cada relato é único, por mais que contem a mesma história, cada pessoa que passou por isso, tem seu momento único e seu sofrimento também.
O que não posso deixar de mencionar é o fato de "O diário de Hega" ser um livro um tanto quanto que estranho para quem leu "O diário de Anne Frank", não dá para comparar e nem completar, é diferente.
"O trabalho liberta", diz a placa na entrada de Terezin - campo de trabalho na antiga Tchecoslováquia para onde Helga foi levada com sua família. O livro é uma reunião de vários escritos de Helga desde que Praga foi invadida pelas tropas alemãs até a libertação dela e de sua mãe, 3 anos e meio depois.
Helga tinha 12 anos quando sua família foi levada para Terezin. Lá separavam homens e mulheres, o que gerou a separação de seu pai dela e de sua mãe. Nesse campo de trabalho, Helga relata como se manteve com sua mãe, as vezes (clandestinamente) encontrava com o pai, como era seu cotidiano, amizades, impressões e ingenuidades (demorou para entender sobre a existência de câmaras de gás e campos de extermínio). Em Terezin que viu pela última vez seu pai, que estava em um dos "transportes" (trens que levavam os judeus para outros campos, sem saberem se era de trabalho ou extermínio).
De Terezin, Helga e sua mãe foram mandadas para Auschwitz - Birkenau (local já conhecido, acredito), sendo que permaneceram pouco tempo lá, mas essa estada foi o suficiente para que as duas enxergassem o tamanho da guerra que estavam vivendo, e a partir de então, foram despachadas para outro campo, com o pensamento constante que encontrariam a morte.
O último trem que estiveram, foi o pior de todos os momentos, enfrentaram o medo, a fome, a imundície, as doenças e os maus tratos. Angústia infinita para o fim do sofrimento que não chegava. Nesse momento, as páginas se mostram tão profundas que é possível sentir uma parte da dor que aquelas pessoas sentiram, sentir ódio por aqueles insanos que estavam levando tantos seres humanos ao sofrimento agudo e a morte. Ao final Helga e sua mãe sobrevivem.
Vale ressaltar que o diário, Helga o recuperou depois de um ano de sua libertação e retorno à Praga, e nele continuou os registros de onde parara. Os escritos são de diferentes épocas, antes e após o final da II Guerra, é possível até perceber o crescimento narrativo do diário, pois todo o material foi editado pela própria Helga, removendo ou acrescentando informações, datas e impressões posteriores à escrita original. Isso na verdade, é informado no inicio do livro pelo organizador, o que para mim, quebrou um pouco a autenticidade do relato, mas em geral é um testemunho forte sobre todo aquele horror.
A principal novidade, ao meu ver, é que além dos textos do diário, há a publicação de uma entrevista com a Helga Weiss, o que ajuda o leitor a entender como foram os primeiros períodos do pós-guerra, e mais ainda a situação de que as guerras para essas pessoas não terminam, nem mesmo depois de decretada a paz.
Outro diferencial são as fotos, ilustrações feitas pela própria Helga que retratam o dia a dia nos campos de concentração, e que nos leva a uma noção ainda maior do sofrimento de todas aquelas pessoas. Lendo e vendo o livro, mais uma vez me pego refletindo, como foi possível que o mundo permitiu que as coisas chegassem a tal ponto?!